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Vitor Mineu 3 d · Carlos Matos Gomes · Os génios europeus jogam com o cubo rubik

 

Carlos Matos Gomes
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Os génios europeus jogam com o cubo rubik
A viagem de Macron, o presidente francês, e de Ursula Von der Leyen, a ainda presidente da comissão europeia e futura secretária-geral da NATO a Pequim é uma daquelas jogadas que devem ser geniais, mas que exigem um cérebro construído com esparguete para a deslindar. Talvez eles entendam que os europeus, tal como os chimpanzés, podem construir o cubo rubik sem eles lhes explicarem o que está por detrás da habilidade.
O anúncio da visita lembrou-me a opinião de um amigo meu, adepto do Benfica, sobre um jogador nórdico chamado Stromberg que há muitos anos jogou por cá: Ele é um grande jogador, a bola é que o atrapalha!
Penso que o atual elenco da UE é como o Stromberg: eles são grandes políticos (do Borrel ao Mitchel), a política e a realidade, a bola a rolar sobre o terreno e entre adversários é que os atrapalha.
Os dirigentes da União Europeia, sob o entusiástico incentivo de Ursula, submeteram-se de olhos fechados (mas de bolsos abertos) à estratégia dos EUA gizada nos anos 90 do século passado de enfraquecer a Rússia, ameaçando-a com a utilização da Ucrânia como base de ataque e de provocação.
A Europa, com Úrsula e Boris Johnson, o mordomo inglês, declararam guerra à Rússia, invocando exatamente os mesmos argumentos americanos: lutar bravamente por princípios morais contra a invasão de um pacífico e democrático país contra o direito internacional e o respeito pela soberania! (A História da Humanidade começou em Fevereiro de 2022!)
Os argumentos eram falaciosos a vários títulos, a ONU, a entidade internacional que deve zelar pela paz não atribuiu essa missão aos EUA, já não tinha atribuído no Iraque, nem no Afeganistão, nem na Síria. Mas a União Europeia decretou sanções contra a Rússia e colocou-se como parte no conflito. Daqui resultou que a União Europeia expulsou a Rússia da Europa e a atirou-a para os braços da China. Foi uma decisão europeia!
Resultante da inteligência estratégica dos dirigentes europeus (os americanos têm outros dados em equação) o conjunto Rússia-China passou a ser militarmente mais poderoso (ou de igual nível) que os Estados Unidos, a China já era o maior produtor industrial do mundo e a Rússia dispõe das maiores reservas de algumas das matérias primas mais raras. Agora estão associadas. Logo mais fortes, ao contrário da Europa, que ficou dependente da cara energia dos EUA (o gás liquefeito das rochas betuminosas e com mercados condicionados pelas sanções). Excelentes opções cujos resultados estão a ser visíveis nas manifestações um pouco por toda a Europa. (Reformas, saude, habitação — a Europa empobreceu.)
Para a China (como para Rússia), a União Europeia é hoje um estado vassalo dos EUA. Para a China a Rússia não pode perder o conflito com os EUA (correspondia a animar o inimigo) e a Europa é uma base de ataque à Rússia.
É com estas credenciais que Macron e Ursula Von der Leyen se apresentam em Pequim! Sendo as coisas como são, o que vai o par de jarras fazer a Pequim se os chineses entendem que a União Europeia não dispõe de autonomia para tomar qualquer decisão que não seja a favor dos interesses de Washington?
A China não será mediadora do conflito: é aliada da Rússia.
A China (e também a Índia) está a ganhar muito dinheiro com a venda de matérias-primas russas e estão a conquistar zonas de influência importantes em África e na América do Sul.
O que é importante na relação da China com a União Europeia? Que os seus produtos de alta tecnologia — os sistemas de 6, 7 e mais G — possam ser comercializados na Europa. Mas isso não é admitido pelos EUA, que já sabotaram a Huawei e agora o Tik-tock.
Uma última pequena história. Quando, na I República, o governo de Afonso Costa fazia os possíveis e os impossíveis por introduzir Portugal na I Grande Guerra, perante a resistência dos ingleses, virou-se para a França, que ainda equacionou atribuir um pequeno setor aos portugueses, mas antes de tomar uma decisão o governo francês comunicou ao governo português: perguntem a Londres se eles aceitam.
Xi Jiping conhece os objetivos da Rússia e quererá saber deste par o que diz Washington sobre as propostas que eventualmente levem. É essa bola que nem o francês nem a alemã dominam, resultante da opção pela sujeição, que, tal como ao Stromberg, atrapalha os dois emissários, os quais devem ter uma qualquer ideia genial, mas que não se percebe qual.
No ponto de desconfiança que existe entre as partes, a China não tem qualquer garantia que aquilo que Macron e Ursula lhe digam corresponda a um compromisso sério. Um passado de mentiras e compromissos violados desde os anos 90 é a única carta de recomendação que o par leva para a China.
Há uma última explicação para a visita: o sistema financeiro “ocidental” está na eminência de rebentar. Os chineses têm o colete salva-vidas. Que preço pedirão por ele? E a bomba da finança pode ser a verdadeira arma nuclear de que tantos estrategas falam com ogivas e cogumelos radioativos. Mas poderá não ser de átomos a tal destruição, mas da falência generalizada do sistema de moeda virtual. Não morremos reduzidos a pós radioativos, mas ficamos tesos! Voltaremos à etapa anterior da evolução.
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Born 1946; retired military, historian
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